Não faltam estudos sobre o impacto do excesso de telas entre crianças e adolescentes, mas isso não significa que os adultos estejam livres de danos. Embora as pesquisas ainda sejam escassas, há cada vez mais evidências dos prejuízos à saúde mental de pessoas de diversas faixas etárias.
Uma revisão recente coloca as redes sociais ao lado do tabaco, álcool e jogo como fator de risco para sintomas depressivos, ideação suicida e autolesões. O resultado está no periódico científico PLOS Global Public Health.
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Com o excesso de telas, termos como “brainrot” ou ‘burnon” têm se tornado populares. O “brainrot” se refere a uma espécie de deterioração do cérebro por consumo de conteúdo inútil. Já o “burnon”, a uma exaustão por excesso de conectividade.
Isso porque o abuso de jogos, videogames, internet e, especialmente, das redes sociais, afeta as pessoas de várias formas. “Primeiro tem a questão do culto da beleza, da vida perfeita. Então há um mecanismo comparativo em que parece que a vida do outro é melhor, que ele está melhor financeiramente, fisicamente. Isso gera uma pressão tanto interna quanto social em busca da perfeição”, analisa o psiquiatra Gabriel Okuda, do Hospital Israelita Albert Einstein.
Saúde mental
Segundo o especialista, isso tem impactos diretos na saúde. “Essa busca por aprovação constante, de alcançar mais likes e seguidores, pode provocar ansiedade e sintomas depressivos”. Pior ainda se a pessoa já estiver vivendo um momento de estresse, podendo causar também sintomas como irritabilidade e insônia.
Além disso, há uma exposição a um volume enorme de informação. “Essa hiperconectividade gera um excesso. Não conseguimos lidar com tanta informação ao mesmo tempo e prestar atenção em tudo. As pessoas consomem cada vez mais conteúdo em menos tempo. São coisas que não prendem tanto a atenção, vídeos curtos, pouco texto, bordões para aprender rápido”, diz o especialista. Não à toa, há uma explosão de queixas de falta de atenção e memória, observa o psiquiatra.
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O uso em excesso de telas também tem potencial viciante, pois, às vezes, elas são usadas como uma válvula de escape da vida real. Pode até parecer prazeroso ficar desconectado da realidade. No entanto, esse prazer instantâneo e ficar esperando a “próxima missão do jogo” provoca liberação de dopamina como um “mecanismo de recompensa”. E isso pode fazer o cérebro ficar viciado nessa sensação.
Impactos na rotina
O fato de passar horas consumindo conteúdos repetitivos, que não exigem muita atenção nem trazem aprendizados ou grandes desafios para o cérebro, pode até impactar o desenvolvimento cognitivo. É que o córtex pré-frontal, região responsável pelas funções cognitivas superiores — como controle de impulsos e regulação emocional, resolução de problemas, atenção e tomada de decisão — amadurece até por volta dos 25 ano. Mas, para isso, precisa de bons estímulos.
Quanto mais tempo no mundo digital, menor a dedicação a outras atividades, como praticar esportes, ter contato com a natureza, investir nos relacionamentos e no autocuidado. “A pessoa acredita que está convivendo com outros, mas está num quarto sozinho. Isso é deletério para o convívio social no geral, impacta os afetos, a capacidade de empatia, de lidar com situações do cotidiano”, diz Okuda.
Sinais de alerta
Se a pessoa não consegue controlar a frequência e a intensidade desses usos, significa que algo não vai bem. “É um problema quando isso acaba tendo prioridade sobre a própria vida offline, prejudicando o trabalho, os estudos, relacionamentos. Muitas vezes, porém, isso só é percebido em estágios avançados, quando já há prejuízos à saúde física e mental”, alerta Okuda.
Como não é possível viver num mundo sem telas, é preciso encontrar um equilíbrio. E a receita não é muito complicada. O tempo gasto com elas não pode ser muito grande comparado ao dedicado a outros aspectos da vida, incluindo momentos de autoconhecimento.
“A gente deve pensar em uma forma de balancear nossa vida. Podemos usar (esses dispositivos), mas de um jeito parcimonioso. Sem nos preocupar tanto com o que estamos postando, se estamos sendo bem-vistos ou comparados”, orienta Okuda. “Quanto menos isso nos consumir ou gastar nossa atenção, mais tempo teremos para voltar nosso foco, afetos e vontade a outras atividades e vivências do mundo real”, finaliza.
Fonte: Agência Einstein