As internações por herpes-zóster cresceram quase 20% em um ano no Brasil. A doença é causada pelo vírus varicela-zoster (VVZ), o mesmo responsável pela catapora. E quem desenvolve herpes-zóster apresenta febre, dor de cabeça, mal-estar, dores, sensação de formigamento, agulhadas ou adormecimento em determinada região do corpo. Também surgem bolhas com líquido transparente, especialmente no tórax, abdômen e rosto.
O herpes-zóster não faz parte das enfermidades de notificação compulsória — aquelas que precisam ter seus casos obrigatoriamente informados às autoridades de saúde para serem monitoradas. Por isso, isso não existem dados oficiais da sua incidência no Brasil.
Dados do Ministério da Saúde, no entanto, mostram que as internações por herpes-zóster vêm aumentando no Sistema Único de Saúde (SUS). Em 2020, foram 3.517 internações por herpes-zóster; em 2023, 4.202 — um salto de 19,5%. “De fato, a doença é muito prevalente. Existem estudos nos Estados Unidos que apontam que um em cada três indivíduos vai desenvolvê-la em algum momento da vida”, conta o infectologista Rodrigo Lins, consultor da Sociedade Brasileira de Infectologia.
O infectologista André Cotia, do Hospital Israelita Albert Einstein, também percebe um crescimento no número de casos. “Há evidências científicas que sugerem um aumento na incidência de herpes-zóster no Brasil, especialmente após a pandemia de Covid-19”, relata.
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Causas do aumento
Segundo os especialistas, esse fenômeno está acontecendo, principalmente, porque os mais atingidos são os idosos, grupo cada vez mais representativo na população. Outro ponto é que, no Brasil, a aplicação da vacina da catapora em crianças só começou na década de 1990. Ou seja, a maioria da população que atualmente tem mais de 35 anos teve catapora na infância. “Estudos revelam que de 90% a 95% das pessoas tiveram contato com o vírus até terminarem a escola”, conta Lins.
Isso faz toda a diferença: depois que a pessoa teve varicela, conhecida popularmente como catapora, o vírus fica alojado em um gânglio nervoso em estado de latência, o que significa que fica adormecido dentro do organismo sem manifestar sintomas clínicos.
Alguns fatores podem fazer com que esse equilíbrio seja rompido, de modo que o microrganismo “acorde” e desenvolva o herpes-zóster (que não tem nada a ver com o herpes simples, que se manifesta na boca ou na região genital).
A causa mais comum é a chamada imunossenescência, processo de deterioração do sistema imunológico decorrente do envelhecimento natural do organismo, que faz com que as defesas do corpo fiquem menos eficientes. Casos que levam ài munodepressão, como câncer, HIV, pneumonia ou medicamentos que têm esse efeito, também podem ser responsáveis pela manifestação do quadro.
Transmissão
Praticamente todo mundo tem o vírus varicela-zóster alojado no organismo, e ele pode dar as caras em algum momento. No entanto, o contato com uma pessoa doente aumenta muito o risco de desenvolvê-la. “Embora o herpes-zóster seja menos contagioso do que sua infecção primária por varicela, ainda pode representar um risco, principalmente para imunodeprimidos, bebês e adultos sem imunidade ao vírus”, alerta Cotia.
“O micro-organismo pode ser transmitido por gotículas respiratórias, mas o modo de contágio mais comum é o contato direto com o fluido das bolhas que surgem na pele”, explica Cotia.
Gravidade
A enfermidade pode levar a uma série de complicações, categorizadas como neurológicas e oculares. Entre as neurológicas, a neuralgia pós-herpética (NPH) é a mais comum e caracterizada por dor persistente por mais de 90 dias após o surgimento das erupções na pele. Já o herpes-zóster oftálmico (HZO) envolve o ramo oftálmico do nervo trigêmeo, causando inflamação na córnea e até perda de visão.
Podem surgir ainda problemas como hepatite e pneumonia, além de disfunção da bexiga e do intestino, quando a doença atinge a região lombar ou sacral, e risco aumentado de derrame e infarto. A incidência e a gravidade são maiores em pacientes imunocomprometidos e em adultos mais velhos.
“Para o paciente jovem saudável, algumas questões, como o aumento do risco de infarto, podem não ser tão significativas, mas para o mais velho, que muitas vezes já é hipertenso, cardiopata ou já tem insuficiência cardíaca, isso pode, sim, fazer a pessoa infartar”, afirma Lins. “Existem pessoas que chegam ao hospital infartando e, logo depois, evoluem para um caso de herpes-zóster, o que mostra que uma coisa estava ligada à outra”, complementa.
Veja as complicações do herpes-zóster
- Ataxia cerebelar aguda, que pode afetar o equilíbrio, fala, deglutição, movimento dos olhos, mãos, pernas, dedos e braços;
- Trombocitopenia, ou seja, baixa quantidade de plaquetas, responsáveis pela coagulação, no sangue;
- Infecção bacteriana secundária de pele – impetigo, abscesso, celulite, erisipela, causadas por Staphylococcus aureus, Streptococcus pyogenes ou outras que podem levar a quadros sistêmicos de sepse, com artrite, pneumonia, endocardite, encefalite ou meningite e glomerulonefrite;
- Síndrome de Reye, doença rara que causa inflamação no cérebro e que pode ser fatal, associada ao uso de AAS, principalmente em crianças;
- Infecção fetal, durante a gestação, pode levar à embriopatia, com síndrome da varicela congênita (expressa-se com um ou mais dos seguintes sinais: malformação das extremidades dos membros, microftalmia, catarata, atrofia óptica e do sistema nervoso central);
- Varicela disseminada ou varicela hemorrágica em pessoas com comprometimento imunológico;
- Nevralgia pós-herpética (NPH) – dor persistente por 4 a 6 semanas após a erupção cutânea, que se caracteriza pela refratariedade ao tratamento. É mais frequente em mulheres e após comprometimento do trigêmeo.
Diagnóstico precoce
O herpes-zóster normalmente é uma doença autolimitada. Isso significa que, mesmo sem tratamento, irá se resolver sozinha. Entretanto, o tratamento feito com medicamentos antivirais, que deve ser iniciado até 72 horas após o início das erupções cutâneas, reduz significativamente a duração e a gravidade do quadro e da dor aguda, além de diminuir a probabilidade de neuralgia pós-herpética.
“As diretrizes de diversas sociedades médicas enfatizam que a terapia antiviral sistêmica, quando iniciada dentro de 48 horas a 72 horas, pode encurtar o processo de cicatrização e mitigar tanto as complicações agudas quanto as crônicas, particularmente em pacientes com mais de 50 anos e naqueles com herpes-zóster na área da cabeça e do pescoço”, afirma Cotia.
Por isso, é muito importante procurar ajuda médica diante de qualquer sinal que possa indicar a doença “Se sentir uma dor mais forte que lembra uma queimação, procure um especialista, pois existem casos sem lesões, só de dor”, recomenda Lins.
Quem pode se vacinar?
Todas as pessoas acima de 50 anos, para os imunodeprimidos e para quem já teve herpes-zóster depois de completar 18 anos devem se vacinar. Contudo, a vacina não está disponível no SUS, apenas na rede particular.
Até meados de 2022, a única vacina disponível era aZostavax, um imunizante atenuado, ou seja, composto pelo vírus ativo, mas enfraquecido. Sua aplicação foi descontinuada no país por não poder ser usada em indivíduos imunocomprometidos.
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No mesmo ano, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) aprovou a Shingrix. Feita com vírus inativo, ela oferece proteção de mais de 95% contra a doença. Outra vantagem é que, no caso de desenvolver herpes-zóster após a vacinação, há um risco menor de ter a neuralgia pós-herpética.
O ideal, portanto, é que tome o novo imunizante até quem já se vacinou com a Zostavax. Pessoas que se vacinaram contra a catapora na infância também podem se beneficiar, já que é possível que tenham entrado em contato com o vírus varicela-zóster antes da imunização e desenvolvam a doença mais tarde. A aplicação da vacina é por via intramuscular em duas doses, com intervalo de dois a seis meses entre cada.
Outras formas de prevenir o herpes-zóster
Além da vacinação, as principais medidas de prevenção e controle contra a disseminação do vírus varicela herpes-zóster são:
- Lavar as mãos após tocar nas lesões;
- Isolamento: crianças com varicela não complicada só devem retornar à escola após todas as lesões terem evoluído para crostas. Crianças imunodeprimidas ou que apresentam curso clínico prolongado só deverão retornar às atividades após o término da erupção vesicular;
- Pacientes internados: isolamento de contato e respiratório até a fase de crosta;
- Desinfecção: concorrente dos objetos contaminados com secreções nasofaríngeas;
- Imunoprofilaxia em surtos de ambiente hospitalar.
Fontes: Agência Einstein e Ministério da Saúde