20 - novembro - 2024
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Epidermólise bolhosa: a luta da pequena Maju

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“Nunca pude dar um abraço apertado na minha filha”

epidermólise bolhosa, Maju
Crédito: Arquivo pessoal/Maria Junia Fernandes

Ficar grávida da Maria Júlia foi uma benção. Eu daria a Pedro uma irmãzinha, que seria sua amiga, que iria ajudá-lo nas suas dificuldades, que seria um fator incentivador, um estímulo para ele.

O momento do nascimento da Maria Júlia foi lindo, mágico, indescritível. No entanto, segundos depois, veio a notícia de que algo estava errado. Ela havia nascido sem 80% da pele da perninha direita e com outras peles. Do nascimento até ao diagnóstico foi muito sofrimento. Eu não quis aceitar e me perguntava: meu Deus, por quê? Mas, pouco depois, eu já me sentia preparada para lutar pela vida da minha filha!

Fomos transferidas para o Hospital das Clínicas, em Belo Horizonte, onde ficamos por 30 dias até a alta. Em casa, tive que aprender a ser uma verdadeira enfermeira. Dedicação exclusiva a Maria Júlia. Até o jeito de carregá-la no colo precisa de muito cuidado. Nunca pude carregar minha filha como um bebê, pegando-a por baixo das axilas e sentando suas perninhas nos meus braços. Só a carregamos com um travesseiro protegendo o seu corpinho. Nunca pude dar um abraço apertado na minha filha.

A cada dia, uma nova bolha

Conviver com a epidermólise bolhosa requer muita força, sabedoria mental e, principalmente, espiritual. As feridas são severas. A cada dia, uma nova bolha. Maria Júlia sente dores fortes desde o dia em que nasceu. Para se ter ideia, ela faz uso de morfina.

“A hora da troca dos curativos é o momento mais sofrido. Muito choro e muita dor, de todos os lados (já cheguei a desmaiar por ver o sofrimento dela).”

A cada troca de curativos, uma surpresa. Quase sempre percebemos uma piora. Os dedinhos dos pés já começaram a grudar, e isso é uma tristeza enorme pra mim.

Maria Júlia não pode tomar banho todos os dias, não pode usar as roupinhas que foram compradas para ela, não pode ser carregada sem proteção. É uma privação enorme para ela e para nós, que a amamos e que queremos beijá-la, abraçá-la e ver o seu desenvolvimento.

Epidermólise bolhosa: tratamento chega a R$ 30 mil/mês

O tratamento da epidermólise bolhosa é caro. Chega a R$ 30 mil por mês, e o governo não ajuda como deveria. Cheguei à situação de receber do Estado, mesmo a liminar que tenho determinando ajuda, dois rolos de faixas e esparadrapos comuns. Sendo que usar faixas comuns em pessoas com epidermólise bolhosa significa aumentar o seu sofrimento. Elas grudam nas feridas e ao retirá-las a pele solta por completo, ficando na carne viva.

Os curativos usados em portadores de epidermólise bolhosa são especiais, muitos até importados. São curativos que ajudam na cicatrização, refrescam a pele e não grudam. Alguns chegam a mais de R$ 3.000 por mês. 

Já o município começou a ajudar, mas depois interrompeu. Ou seja, se não fosse a campanha que temos feito, se não fossem os meus familiares e amigos e não estaria conseguindo. O caso de Maria Júlia tem ganhado grande repercussão. Chegamos a 44 mil seguidores no Instagram (@ajudeamaju). Pessoas de outros países têm ajudado. É uma causa justa.

Em Várzea a Palma, onde moramos, não temos hospitais para tratar a epidermólise bolhosa. Precisamos nos deslocar para Belo Horizonte com grande frequência. A viagem, para a Maria Júlia, é sofrida, devido ao contato constante com a cadeirinha e o atrito. Então, ela sempre volta para a casa com mais bolhas que arrebentam e viram feridas.

Viagens às pressas

Já vivemos duas situações de precisarmos viajar às pressas para BH, por Maria Júlia estar com infecção. E o tempo nas condições dela é valioso. É que uma infecção pode levar minha princesa embora. Por isso tomei a decisão de me mudar para BH. Em breve, estarei morando na cidade com os meus dois filhos.

epidermólise bolhosa, Maju
Crédito: Arquivo pessoal/Maria Junia Fernandes

Será bom para Maria Júlia, devido à assistência médica (no caso da epidermólise bolhosa, o HC é considerado especializado. Nem os hospitais da rede particular estão prontos para tratar a doença), e para Pedro, que não precisará mais ficar longe de mim quando vou para Belo Horizonte e não terá seu tratamento e terapias interrompidas devido à minha ausência.

Sem cura, mas com esperança

Não existe cura para a epidermólise bolhosa, mas há esperança. Um transplante de medula pode melhorar em 80% a qualidade de vida do portador. Mas, mesmo assim, a pessoa irá precisar de cuidados para o resto da vida.

No Brasil, apenas um transplante de medula foi realizado em portador de epidermólise bolhosa, há um ano, em uma criança – a Raissa, hoje com 7 anos (@parapoderabraçar). Hoje, a criança não está curada, mas as suas condições melhoraram muito. O transplante da Maria Júlia foi aprovado pela equipe médica do Albert Einstein (em São Paulo). Agora estamos aguardando o valor para levantar os recursos. Será o primeiro transplante em bebê no Brasil para o tratamento da epidermólise bolhosa.

Tempo integral para os dois filhos

Não sei vocês sabem, mas eu sou mãe solo, sou sozinha. Meu filho de 6 anos é autista, grau elevado. Então, quando Maria Júlia nasceu, larguei meu trabalho para cuidar integralmente dos dois. Não tive outra opção. Eu preciso estar ao lado deles integralmente. Por mais que as pessoas me ajudem, eu preciso estar por perto. Por isso, hoje, vivo da ajuda da família, de amigos e de doações que, graças a Deus, até agora, estão sendo suficientes para os tratamentos dos dois, principalmente para os cuidados com a Maria Júlia que chegam até aos R$ 30 mil por mês.

Sempre trabalhei, era uma pessoa independente. Mesmo após o nascimento de Pedro, e de ele ser diagnosticado com autismo. Eu trabalhava e oferecia a ele todos os recursos que uma criança autista precisa para se desenvolver. Oferecia qualidade de vida. Mas, para doenças como a de Maria Júlia, infelizmente, o nosso país não nos oferece condições, por isso muitas pessoas passam a depender da solidariedade do outro, a expor suas vidas para conseguir recursos, como eu.

“Para encerrar, cuidar de uma criança com epidermólise bolhosa é uma das missões mais difíceis e doloridas, mas também uma das missões mais lindas e especiais. É preciso muito, mas muito amor.”

Amor e muita garra

E o Brasil, um país que não oferece a mínima condição para você cuidar de uma pessoa com uma doença rara (basta acessar a ONG O Jardim das Borboletas – @ojardimdasborboletas – para entender o que estou dizendo), exige da gente, além de amor, muita garra para conseguir o mínimo de qualidade de vida para o portador da doença.

Maju, como a chamamos carinhosamente e como ela é conhecida pelas pessoas que abraçaram a causa Todos por Maju (@ajudeamaju), é minha luz, minha esperança, minha guerreira, minha borboleta. Por ela e por Pedro, eu sou capaz de tudo!

Leia mais:

Câncer infantil: o depoimento de uma mãe que luta há um ano contra a doença

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Maria Júnia Fernandes
Maria Júnia Fernandes
Maria Junia, 38, é mãe de Maria Júlia, de 9 meses, que nasceu com epidermólise bolhosa, o que provoca feridas em seu corpo e muitas dores. Aqui, em depoimento ao Papo no Consultório, ela conta sobre a força da filha diante das dores. Crédito da foto: Maria Junia Fernandes

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